O julgamento da ação para reverter a anulação da Terra Indígena (TI) Guyraroka, do povo Guarani Kaiowá em Mato Grosso do Sul será retomado na segunda-feira (29), pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

O processo foi votado em 2014, pela Segunda Turma do STF, e resultou na anulação do procedimento administrativo de demarcação das terras indígenas. Agora, o recurso é movido pela própria comunidade indígena, que usa como principal argumento a ausência de participação da comunidade da TI Guyraroka no processo.

O povo Guarani e Kaiowá tenta reaver a demarcação do tekoha (no português, lugar onde se é) Guyraroka desde a anulação, em 2014. São 26 famílias na aldeia, que hoje vivem numa área de 55 hectares, uma parcela dos 11 mil hectares identificados e delimitados pela Funai em 2004 e declarados como de ocupação tradicional indígena pelo Ministério da Justiça em 2009.

De acordo com o Conselho Indígena Missionário, a comunidade vive cercada por grandes fazendas, que ocupam seu território para o plantio, gerando ameaças às lideranças e até a intoxicação de crianças e adultos pelo veneno despejado nas lavouras, separadas da aldeia apenas pelas cercas de arame.

O risco de um possível despejo, caso a anulação não seja revertida, e a situação de violência e violações vivenciadas pelos Guarani e Kaiowá em Mato Grosso do Sul fizeram com que o caso fosse levado ao Conselho de Direitos Humanos da ONU e à Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), que foi à terra indígena durante sua visita ao Brasil, em 2018.

A CIDH classificou a situação do povo Guarani e Kaiowá como uma “grave situação humanitária” e emitiu, em 2019, medidas cautelares em favor dos indígenas da TI Guyraroka, solicitando ao Estado brasileiro que tome providências para garantir o direito à vida e à integridade pessoal dos membros da comunidade.

“Estamos na expectativa desse julgamento, pedimos aos ministros que avaliem nossa situação e a precariedade onde estamos vivendo hoje”, reivindica Erileide Domingues Guarani Kaiowá, moradora do tekoha Guyraroka. “Vamos nos manifestar e insistir pela vitória”.

A ausência de representatividade da comunidade no processo em 2014 é inconstitucional, já o direito de acesso à Justiça é garantido expressamente aos povos indígenas no artigo 232 da Constituição Federal de 1988.

Outro argumento usado pela defesa da comunidade indígena é o fato de que a decisão baseou-se na tese inconstitucional do marco temporal, ainda em discussão no Supremo, e foi tomada a partir de um mandado de segurança. Esta modalidade jurídica não permite a apresentação de novas provas e o próprio STF vem decidindo que ela não deve ser utilizada para discutir demarcações de terras indígenas, devido à complexidade do tema.

O julgamento se dará em plenário virtual, onze ministros votam numa plataforma online, ao longo de uma semana, sem necessidade de reunião por videochamada e tampouco espaço para sustentação oral das partes.

Processo

O povo Guarani e Kaiowá chegou a recorrer da decisão da Segunda Turma, mas seus pedidos de admissão foram negados, e o processo transitou em julgado em meados de 2016. Inconformada, a comunidade da TI Guyraroka ingressou em 2018 com a Ação Rescisória (AR) 2686, que busca reverter o julgamento no qual foi ignorada.

A rescisória começou a ser julgada em 2018, mas foi retirada de pauta após um pedido de vistas do ministro Edson Fachin. A ministra Carmen Lúcia e o ministro Luiz Fux, relator do caso, votaram contra o pedido da comunidade. A Procuradoria-Geral da República (PGR) manifestou-se favoravelmente aos indígenas. Em 2019, o julgamento chegou a retornar à pauta da Corte, mas foi novamente adiado.

Fonte: Correio do Estado