A franquia Sobrenatural nunca esteve realmente interessada em desenvolver sua família protagonista. Os Lamberts, um dos núcleos mais importantes do universo de terror criado por James Wan, são uma família rodeada por entidades muito mais marcantes que eles mesmos. Desde suas assombrações – o demônio da cara vermelha ou a noiva de preto – até seus salvadores – Elise e Carl -, todo mundo sempre teve mais personalidade que Josh, Renai, Dalton e os outros dois filhos de quem ninguém sequer lembra o nome. Até por isso, o terceiro e quarto filmes da franquia deixam os Lamberts para trás para focar na estrela da história, Elise (Lin Shaye). Mas tudo isso vira de cabeça para baixo em Sobrenatural: A Porta Vermelha, filme que foca nos Lamberts de uma vez por todas, enxergando o que antes era sua fraqueza como seu principal poder.

É um caminho inesperado e inteligente que o criador da história, Leigh Whannell, e o protagonista Patrick Wilson resolvem tomar. Wilson estreia como diretor em uma trama contada dez anos depois dos acontecimentos dos dois primeiros filmes. Os Lamberts surgem aqui (lindamente representados pelos mesmos intérpretes de antes, com exceção de Kali), fragmentados pelos traumas do passado e impactados por sua decisão de esquecer o que lhes aconteceu. Com isso, Sobrenatural 5 já começa com o clima pesado, no funeral de Loraine, com Josh e Renai separados e vivendo uma relação visivelmente conturbada com seus filhos.

Dividido em dois núcleos, com Dalton (Ty Simpkins) indo para a faculdade e Josh (Wilson) buscando se conectar com seu filho ao mesmo tempo em que tenta entender seus lapsos de memória, A Porta Vermelha se desenvolve de um jeito surpreendentemente tocante e sensível, o que talvez não seja o que o fã de Sobrenatural estivesse esperando. Mas é notável que este é o primeiro filme da franquia Insidious que realmente gosta destes personagens, o que os torna vítimas interessantes. O movimento é certeiro porque faz dos acontecimentos aterrorizantes mais difíceis de testemunhar.

E ainda despontam ótimas ideias neste sentido: visível discípulo de Wan, Wilson não é exatamente inovador em sua direção, mas se mostra absolutamente capaz de construir e prolongar tensão, sua principal ferramenta para criar o terror aqui. A Porta Vermelha investe menos em jumpscares do que seus antecessores, e gosta mais de deixar aquela sombra, criatura ou entidade crescendo no fundo, chegando aos poucos, rastejando em nossa direção de modo super eficiente. Mais do que isso, ele entrega uma cena perfeitamente claustrofóbica e assustadora em um exame de ressonância magnética, empolgante de imediato por seu simples potencial de pavor.

Tudo corre muito bem em Sobrenatural: A Porta Vermelha até o meio da história. Acompanhar o desenvolvimento de Dalton, que explora seus pesadelos ao lado de Chris (Sinclair Daniel) – um alívio cômico melhor do que a dupla tradicional de Specs e Tucker (Leigh Whannell e Angus Sampson) – é cativante, e a cavocada no passado de Josh também é promissora. É uma pena que o filme derrape na reta final, quando precisa conectar todas as possibilidades que abriu tão bem. E isso não é culpa de Wilson, Whannel ou do elenco, mas de um roteiro (de Scott Teems) que não consegue encaminhar a história para um final coeso ou criar o ritmo de clímax e desfecho. A Porta Vermelha conduz sua conclusão como um acidente esquisito de testemunhar.

Sobrenatural precisa ir para o Além no fim, claro, e o quinto filme usa bem uma das melhores tradições da franquia, o recurso de retomar cenas do passado sob uma nova luz. Mas seria mais recompensador se tudo acontecesse com um propósito e com um plano, e não em uma bagunça que se desdobra independentemente dos personagens.

Que Sobrenatural: A Porta Vermelha tenha escolhido uma resolução piegas não é problema no fim, nem o fato de a lição de moral acabar remetendo a Frozen – é uma mensagem válida, afinal. Josh e Dalton sempre foram posicionados como vulneráveis aos espíritos malignos porque têm uma habilidade de passear pelo Plano Astral. Mas, dez anos depois, é natural que chegue a hora de abraçar esse poder. O problema é que a amarra de tanta promessa degringola para um final aleatório, um que não deixa claro porque chegamos ali ou porque tudo aquilo importa. No fim, fica o amargor de assistir o desfalecimento de um novo capítulo que chegou com tanta vontade – e trouxe um ineditismo tão essencial à franquia.

Fonte: Omelete