Embora não seja obrigado a compensar os gastos gerados pela emenda constitucional que turbina benefícios sociais às vésperas das eleições, o governo entende ser ideal neutralizar os efeitos dela nas contas públicas buscando novas receitas.

Por isso, o Ministério da Economia pediu a grandes estatais para que elas mudem sua política de dividendos e paguem mais ao Tesouro Nacional neste ano.

O movimento é feito após reações negativas do mercado sobre a emenda, que liberou R$ 41,25 bilhões fora das principais regras sobre as contas públicas -como a meta fiscal (resultado de receitas menos despesas a ser perseguido pelo governo), o teto de gastos (que impede o crescimento real das despesas federais) e a necessidade de compensações orçamentárias.

Um ofício com a solicitação foi encaminhado às quatro principais estatais -Petrobras, BNDES, Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal. De acordo com o secretário especial do Tesouro e Orçamento do Ministério da Economia, Esteves Colnago, o governo questionou se as empresas têm condições de aumentar o repasse aos acionistas, se aproximando de 60% do lucro no caso do BNDES, por exemplo, e mudar a periodicidade do pagamento de semestral para trimestral.

“Enviamos um ofício geral em que a gente pede para que eles estudem a possibilidade, respeitada a política de investimentos e respeitados os eventuais requerimentos de Basileia, o que eles podem eventualmente pagar de dividendos e se eles podem nesse exercício pagar trimestralmente e não semestralmente”, disse.

Colnago ponderou que a Petrobras já efetua pagamentos trimestrais, mas que o ofício não foi personalizado para cada empresa. Segundo o secretário, o Banco do Brasil respondeu dizendo que não seria possível atender ao pedido do governo, enquanto as demais estatais ainda não se pronunciaram.

O custo total estimado da PEC (proposta de emenda à Constitucional) promulgada que liberou os benefícios sociais é de R$ 41,25 bilhões. Outro efeito extraordinário gerado por mudanças legais é a redução dos impostos federais sobre combustíveis, que terá um custo de R$ 16,51 bilhões.

Até o momento, o governo conta com pagamento por parte do BNDES de R$ 18,6 bilhões, referente aos lucros obtidos em 2020 e 2021, além dos R$ 26 bilhões recebidos com a privatização da Eletrobras.

“Para essas despesas que foram criadas de forma emergencial com a PEC e com a perda de arrecadação da Lei Complementar 194, que somam R$ 58 bilhões, a gente está buscando ter receitas extraordinárias na mesma magnitude”, afirmou Colnago.

“A parte de despesas já foi arcada com uma receita que não estava entrando, mas a gente gostaria que a parte do índice de receitas também fosse arcada com receita extraordinária”, disse. “Foram criadas obrigações excepcionais, nós pagamos também com receitas excepcionais”, complementou.

Essas receitas extraordinárias com a possível antecipação do pagamento de dividendos não estão contempladas na estimativa do Ministério da Economia de que o governo central encerre 2022 com superávit fiscal -o primeiro em oito anos- ou com déficit próximo de zero.

“A gente está caminhando para chegar no final do ano com déficit muito baixo, próximo de zero, ou com superávit. Seria o primeiro superávit fiscal após oito anos”, disse Colnago em entrevista coletiva para detalhar o relatório de avaliação de despesas e receitas referente ao terceiro bimestre de 2022.

“A expectativa que está se consolidando é que nesse final de ano a gente tenha superávit ainda que pequeno do governo central”, complementou.

O governo central reúne as contas do Tesouro Nacional, da Previdência Social e do Banco Central.

Na última sexta-feira (22), o Ministério da Economia anunciou que a projeção para o déficit primário (que não considera os gastos com juros) do governo central em 2022 diminuiu R$ 6,1 bilhões do relatório anterior para o atual -de R$ 65,5 bilhões para R$ 59,35 bilhões.

Quanto ao bloqueio de R$ 6,7 bilhões do Orçamento de 2022 para cumprir o teto de gastos, que impede o crescimento das despesas federais acima da inflação, o secretário do Tesouro e Orçamento disse, sem dar detalhes, que os Ministérios da Saúde e da Educação estarão entre as áreas que serão atingidas.

“É natural que tenha tido contingenciamento nesses ministérios, como Saúde e Educação, o orçamento deles é muito grande. É natural que tenha nesses órgãos, não é uma falta de critério”, afirmou.

Com o desbloqueio de R$ 2,5 bilhões do FNDCT (Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico), Colnago reconheceu que haverá uma demanda maior por bloqueio orçamentário em outras pastas.

De acordo com o relatório do Ministério da Economia, a necessidade total de bloqueio neste ano subiu R$ 2,77 bilhões, passando de R$ 9,96 bilhões para R$ 12,74 bilhões.

O contingenciamento é feito em meio ao crescimento de despesas com sentenças judiciais, abono salarial e financiamento para a agricultura.

Colnago também afirmou nesta segunda que a PLOA (proposta do Orçamento) para 2023, que precisa ser enviada pelo governo ao Congresso até 31 de agosto, deverá prever o pagamento do Auxílio Brasil de R$ 400, em vez do benefício turbinado de R$ 600 estimado até o fim do ano.

“Temos um marco legal e a obrigação do marco legal é de um auxílio de R$ 400. Acho que não vamos ter uma mudança de marco legal até a PLOA. Acho que a PLOA deve vir com [Auxílio Brasil de] R$ 400”, disse.

Caso o Auxílio Brasil de R$ 600 se torne permanente em 2023, como tem prometido o presidente Jair Bolsonaro (PL), o secretário do Tesouro e Orçamento estima um impacto fiscal adicional entre R$ 50 bilhões e R$ 60 bilhões.

Como esse valor tem de caber dentro do teto de gastos, o governo se veria obrigado a cortar despesas discricionárias, ou seja, não obrigatórias. De acordo com Colnago, seria um desafio e o engessamento do orçamento prejudica os diversos Poderes.

“As últimas discricionárias [não obrigatórias] estavam em R$ 120 bilhões, R$ 130 bilhões [ao ano]. Ao criar um conjunto de obrigatórias que somam R$ 50 bilhões, R$ 60 bilhões, nosso volume de discricionária vai cair para R$ 70 bilhões, o que seria muito difícil ao longo do exercício”, afirmou Colnago.

“Em torno de R$ 70 baixo [bilhões], talvez a gente consiga sobreviver, os ministérios teriam dificuldade, mas poderiam manter o mínimo das políticas”, completou.​

 

FONTE: CORREIO DO ESTADO