Desde 2015, os brasileiros podem contratar um serviço capaz de baixar o valor da conta de luz em até 20%: a energia solar por assinatura.
“Não é tão simples colocar um sistema solar do tamanho de 15 campos de futebol na cidade de São Paulo, mas nos estados de Minas Gerais, Bahia, Pernambuco, Mato Grosso do Sul a aptidão é maior”, diz Rodolfo Molinari, conselheiro da Absolar (Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica).
A modalidade ainda é incipiente no país, mas tem crescido rapidamente nos últimos anos, com mais pessoas buscando formas de driblar a inflação da energia elétrica e aliviar o bolso.
O modelo tem similaridades com os streamings, como Netflix e Spotify, em que o consumidor faz a adesão por um valor –que pode ser fixo ou não– e tem liberdade para cancelar quando quiser.
O serviço é oferecido por empresas que possuem fazendas solares. Na prática, quem faz a assinatura está comprando uma fração da energia produzida por essas companhias e recebendo créditos que podem ser abatidos na conta de luz todos os meses. É essa compensação que permite uma economia entre 10% e 20% na fatura.
Funciona como um consórcio ou uma cooperativa. O consumidor –pessoa física ou jurídica– não necessariamente usufrui da energia gerada na fazenda solar, mas se torna um “produtor”, o que lhe dá direito de descontar a fatia que jogou na rede do total consumido naquele mês.
A empresa fica encarregada de informar à distribuidora de energia, que faz a compensação na fatura.
Por determinação da Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica), a usina deve estar conectada à concessionária onde está instalada e só pode oferecer os créditos (a assinatura) para pessoas e empresas que recebem energia da mesma distribuidora.
A Cemig Sim, por exemplo, atende apenas clientes que estejam na área de distribuição da Cemig, em Minas Gerais. A companhia foi criada em 2019 com o objetivo de competir no mercado de geração distribuída.
A empresa se tornou uma das principais do setor, e hoje conta com 23 fazendas solares em operação, atendendo mais de 7.000 clientes –a maioria pessoas jurídicas.
Segundo João Paulo Campos, diretor da Cemig Sim, já foram investidos R$ 280 milhões no negócio, e a perspectiva é alocar um total de R$ 3,2 bilhões até 2025.
Na visão dele, qualquer pessoa com consumo acima de 100 kWh (quilowatt-hora) por mês tem vantagem fazendo a assinatura. A única exceção são aqueles que têm direito à tarifa social.
A contratação funciona da seguinte forma: o cliente realiza uma simulação no site da Cemig Sim, que calcula uma média de gasto e faz uma proposta de assinatura para a compensação de créditos.
Diferentemente de outros formatos, em que o cliente paga um valor fixo mensal, a Cemig Sim entrega a compensação equivalente ao que a pessoa consumiu. O desconto fica entre 12% e 16%, dependendo das condições da conta de luz.
Consumidores de outras regiões que estejam interessados na energia solar por assinatura devem buscar companhias que forneçam o serviço no local onde moram.
Na capital paulista, por exemplo, ainda não é possível contratar a modalidade. Isso porque a assinatura depende da existência de fazendas solares que forneçam energia para a distribuidora local. Segundo a Enel, não há empresas conectadas à rede que ofereçam esse serviço.
No caso de São Paulo, o problema passa pela dificuldade em encontrar locais para a instalação das usinas –seja pela falta de terrenos apropriados ou pelos valores da locação.
Além disso, a profusão de concessionárias de energia no estado é vista como uma dificuldade. Como a regulamentação determina que a usina solar esteja na mesma área de concessão do consumidor, os estados cuja distribuição é concentrada em uma ou poucas companhias acabam sendo mais favoráveis ao modelo de negócio.
Ele diz que ainda não há uma forma esquematizada de saber quais empresas prestam o serviço por região, mas sugere procurar os canais da Absolar no site da entidade para tirar dúvidas.
A modalidade de energia solar por assinatura foi possível após a Aneel autorizar, em 2015, a geração compartilhada, que é quando um grupo de pessoas usa de um mesmo sistema produtor de energia.
O objetivo foi impulsionar a geração de energia solar no Brasil. Antes disso, cada consumidor precisava instalar sua própria usina, o que nem sempre era possível, seja por questões econômicas ou práticas –já que nem todo local tem boa captação de luz ou consegue acomodar painéis solares.
Segundo a Aneel, já existem empreendimentos na modalidade de geração compartilhada em todos os estados brasileiros. São atualmente 4.183 empreendimentos de geração compartilhada, que atendem 14.811 unidades consumidoras. No entanto, nem todos são de energia por assinatura.
Além de conselheiro da Absolar, Molinari é diretor da Órigo, empresa que atua neste mercado. A companhia opera nos estados de Minas Gerais, São Paulo, Pernambuco e Ceará, e já conta com mais de 60 mil clientes –a maioria pessoas físicas.
Diferentemente de outras provedoras do serviço, a Órigo não trabalha com planos fixos mensais. “O que ofertamos para o consumidor é o desconto. O plano é contratado com base no percentual de desconto sobre o que ele tradicionalmente paga [na conta de luz]”, afirma.
Na prática, a Órigo oferece uma assinatura que é equivalente a 10% de economia na fatura. Após analisar o perfil de consumo, a empresa vende os créditos de energia que vão corresponder ao crédito mensal.
As principais diferenças entre as empresas de energia por assinatura são os valores cobrados pelo crédito de energia e o serviço prestado. Algumas companhias oferecem, por exemplo, monitoramento do consumo e até consultoria para clientes maiores.
A forma de contratação também é diferente. Em alguns casos, o consumidor compra uma quantidade de créditos que deseja abater, por exemplo, 300 quilowatt-hora por mês.
Em outros, como faz a Órigo, o foco é o desconto na conta de luz. Nessa modalidade, o valor da assinatura varia mensalmente, já que o cálculo parte do consumo naquele período.
A Sun Mobi é outra companhia que trabalha com energia por assinatura. Uma das pioneiras do setor, ela opera dentro da área da CPFL Piratininga, que atende 27 cidades do interior de São Paulo.
Lançada em 2016, a companhia tem hoje 300 clientes e atua com foco no nicho gastronômico, como restaurantes e padarias.
“São micro e pequenas empresas que não têm acesso ao mercado livre de energia, mas são grandes consumidoras”, afirma Alexandre Bueno, sócio da Sun Mobi.
Para pessoas físicas, a Sun Mobi oferece planos a partir de 300 quilowatt-hora, que seria o consumo de um apartamento com três quartos. Nesse caso, Bueno diz que a mensalidade ficaria na casa dos R$ 200, o que representa uma economia de 10%, na média.
Energia por assinatura
Embora o volume de clientes ainda seja baixo, considerando os milhões de consumidores do Brasil, a modalidade de energia por assinatura vem crescendo rapidamente no país.
Dados coletados pela Absolar mostram que o número de usuários no modelo de geração compartilhada partiu de 43, em 2015, para mais de 11 mil em 2022.
O movimento acompanha um período em que a conta de luz passou a pesar mais no bolso dos brasileiros. Levantamento feito pela Abraceel (Associação Brasileira dos Comercializadores de Energia) mostra que a conta de luz subiu mais que o dobro da inflação entre 2015 e 2021.
Na avaliação de Alexandre Bueno, da Sun Mobi, a energia por assinatura tem tido boa receptividade no Brasil porque espelha outros serviços, como o streaming, que dão flexibilidade para o cliente escolher o provedor e cancelar quando quiser. “Isso é a tendência para qualquer tipo de serviço.”
Para Molinari, ainda existe o desafio relacionado ao desconhecimento do consumidor sobre o serviço. “Mas eu diria que, neste ano, todos os estados brasileiros vão registrar bastante assinaturas”, afirma.
FONTE: CORREIO DO ESTADO