A retomada de um investimento bilionário em Mato Grosso do Sul pode não suprir a expectativa de produção de fertilizantes.
Em decorrência dos problemas no fornecimento de gás natural, matéria-prima para o funcionamento da Unidade de Fertilizantes Nitrogenados III (UFN3), a unidade pode virar apenas uma misturadora de fertilizantes.
Conforme apurado pelo Correio do Estado com fontes ligadas às negociações da venda da unidade para o grupo russo Acron, a expectativa é de que “ela deixe de utilizar gás natural para produção de amônia e ureia para ser uma misturadora de fertilizantes”, pelo menos nos anos iniciais.
O motivo para tal medida seria a redução da produção de gás natural da Bolívia, principal fornecedor do combustível para Mato Grosso do Sul e alguns outros estados das regiões Sudeste e Sul do Brasil.
Como publicado na edição de 1º de novembro de 2021 do Correio do Estado, o país vizinho sinaliza uma queda na produção do gás natural.
Ao jornal El Deber, o ex-ministro Mauricio Medinaceli disse que as exportações bolivianas de gás passam por um momento “muito frágil”, porque o país não tem capacidade para atender às demandas dos mercados argentino e brasileiro.
Outro empecilho já apontado em reportagem publicada no dia 12 de fevereiro deste ano é que as novas negociações para fornecimento de gás boliviano estão sendo contratualizadas a partir de 2024.
A unidade de fertilizantes que pertence até então à Petrobras foi projetada para consumir diariamente 2,3 milhões de metros cúbicos de gás natural para fazer a separação e transformar em 3.600 toneladas de ureia e outras 2.200 toneladas de amônia por dia.
Caso a fábrica se torne uma misturadora, ela importará os subprodutos, de acordo com a formulação indicada a cada tipo de cultura e necessidade do solo, e misturará as fórmulas para entregar os fertilizantes ao mercado.
GÁS NATURAL
A ampliação da capacidade de fornecimento de gás natural da Bolívia está prevista apenas para 2024, conforme apurado com autoridades locais.
A estatal boliviana Yacimientos Petrolíferos Fiscales Bolivianos (YPFB) tem contrato com a Petrobras atualmente para o fornecimento de 20 milhões de m³ dia.
Esse contrato, em alguns momentos, já encontra dificuldade de ser completamente cumprido por conta da instabilidade no país vizinho.
O gasoduto Bolívia-Brasil (Gasbol) tem capacidade de transporte de 30 milhões de m³ por dia, mas para completar esse total é preciso que o combustível esteja em maior abundância no território vizinho.
Questionado sobre a mudança no perfil da fábrica, o titular da Secretaria de Meio Ambiente, Desenvolvimento Econômico, Produção e Agricultura Familiar (Semagro), Jaime Verruck, disse que a Acron quer começar a operação imediata.
“Eles vão começar a operar dentro do que já existe lá, então não vão esperar para terminar [as obras]. A ideia é que eles utilizem o gás, mas já vão estar fazendo a mistura de adubo [em um primeiro momento]”, avalia.
Ainda de acordo com o secretário, em seis meses, os investidores querem iniciar a atividade.
“A questão gás, a Petrobras pode fornecer para eles. Como até terminar eles devem levar uns dois anos, eles [russos] têm dois anos para negociar o gás, até porque o cenário hoje não é bom porque é caro e está em falta”.
“Tem a possibilidade de transporte de 10 milhões de m³ disponíveis. Então eles terão esses dois anos, eles começam a operar e, enquanto estão construindo, fecham essa questão do gás. E eu não vejo outro caminho competitivo que não seja o da Bolívia, para nós é bom, para a Bolívia é bom, o caminho será com eles”, ressalta o secretário.
INDÚSTRIA
A UFN3 começou a ser construída há mais de uma década e finalmente foi negociada com a gigante russa dos fertilizantes, Acron.
A informação sobre a venda foi confirmada no dia 4 deste mês pela ministra da Agricultura, Tereza Cristina, em agenda em Três Lagoas.
Em comunicado, a Petrobras informou que chegou a um acordo “para as minutas contratuais para a venda de 100% da UFN3 com o grupo russo Acron”.
No dia 11 deste mês, o governo do Estado, a prefeitura de Três Lagoas e representantes da Acron e da Petrobras se reuniram em Campo Grande para definir as questões legais e a concessão de incentivos fiscais.
“O projeto terá algumas modificações em relação ao projeto inicial, e essas modificações precisamos inserir nos termos de acordo. Confirmando que a Acron assume a UFN3 e, provavelmente, no mês de julho inicia os investimentos em Três Lagoas”, disse o secretário Jaime Verruck após o encontro.
Conforme acordado na reunião, a assinatura definitiva da negociação deve ser realizada no mês de julho. Após os trâmites legais, haverá um novo cronograma de obras e funcionamento da fábrica.
O empreendimento, que começou a ser construído em 2011, foi orçado na época em R$ 3,9 bilhões. Apesar de a Petrobras e de o governo do Estado ainda não confirmarem vaores atualizados, a planta alcançou 81% das obras concluídas em 2014, quando foi paralisada.
Após 8 anos de abandono, o investimento necessário para retomar e concluir a obra deve voltar à casa dos bilhões.
3,9 Bilhões de reais
A UFN3 foi orçada em R$ 3,9 bilhões em 2011, quando começou a ser construída na região do Bolsão em Mato Grosso do Sul.
Cronologia
2011> As obras para a construção da Unidade de Fertilizantes Nitrogenados III (UFN3) começaram em 2011, em Três Lagoas;
2014> A fábrica integrava um consórcio composto por Galvão Engenharia, Sinopec (estatal chinesa) e Petrobras. Os responsáveis pela Galvão foram envolvidos em denúncias de corrupção da Operação Lava Jato; com isso, as obras foram paralisadas em dezembro de 2014, com 81% de conclusão;
2018> Em 2018, a subsidiária da Petrobras foi colocada à venda junto da Araucária Nitrogenados (Ansa), fábrica localizada em Curitiba (PR);
2019> A Acron havia selado acordo para a compra da empresa, mas sem um acordo de fornecimento de gás natural o negócio acabou não sendo finalizado;
2020> A UFN3 foi colocada à venda novamente em fevereiro de 2020;
2022> Um novo acordo de venda foi selado com a Acron e deve ser concluído em julho.
FONTE: CORREIO DO ESTADO