Com a guerra na Ucrânia, as principais commodities ligadas ao Leste Europeu apresentam alta. O milho, a soja e o trigo, três culturas que são comuns na região, e as duas primeiras amplamente conhecidas no Estado, já estão perto de atingir marcas históricas por causa do conflito.

Além dos grãos, o barril do petróleo chegou a bater US$ 119,84 na máxima da quinta-feira. A alta de combustíveis e alimentos torna-se questão de tempo para todo o País. E consequentemente a inflação pesará no bolso do consumidor.

De acordo com publicação da Financial Times, o índice S&PGSCI, amplo barômetro do preço das matérias-primas mundiais, saltou 18% nesta semana. O maior aumento registrado nos últimos 50 anos.

Os preços da soja e do milho já vinham pressionados pela seca que castigou a América do Sul e em especial Mato Grosso do Sul. Em dezembro de 2021, a saca com 60 kg de soja era comercializada a R$ 166,71, já no fechamento desta sexta-feira o valor era de R$ 203,62, alta de 22,14%.

O milho passou de R$ 84,91 para R$ 98,15 no mesmo período – aumento de 15,59%.

Carlos Dávalo, corretor da Granos Corretora, explica que no momento há um olhar cauteloso em relação aos preços.

“Em um primeiro momento, o que influenciou a alta nos grãos é a quebra da safra da soja no Brasil, foram 15 milhões de toneladas a menos, isso é fato consumado. Pensando em um segundo momento, aí, sim, a guerra pode influenciar pelas sanções econômicas e políticas”.

Para o economista Eugênio Pavão, a instabilidade econômica já era esperada.

“Como estamos em ano eleitoral, esperávamos esse cenário de incertezas no segundo semestre, motivado pelas eleições. Mas ela chegou antes por causa do cenário internacional”, comenta.

Lilian Linhares, sócia e head de alocação da Rio Negro Investimentos, afirma que essa escassez no mercado internacional é o que empurra os preços para cima.

“Por conta do conflito em curso, poderá haver uma menor disponibilidade dessas commodities nos mercados. Aliado a um cenário de estoques mundiais relativamente baixos, contribuiria para a manutenção dos preços em patamares mais elevados por um período ainda mais longo”.

Ainda segundo o economista, o Brasil será duplamente afetado. “Nós importamos muito da Rússia, como o trigo e fertilizantes, mas também exportamos bastante coisa, como carne suína e outros itens, então, vamos ser afetados nisso também”, avalia Pavão.

PREÇOS

Para o corretor, o preço dos grãos hoje está levando em consideração principalmente o cenário nacional, apenas o trigo está sendo influenciado fortemente pelo conflito.

“O que pesa é que a Ucrânia e a Rússia são os dois dos maiores produtores de trigo do mundo, e isso afeta o preço”, comenta Dávalo.

Para o especialista em comércio exterior Aldo Barrigosse, o momento é de alerta total. Como estamos falando de uma economia globalizada, o custo de produção atrelado ao dólar e a insumos importados, a tendência é de alta para os próximos meses.

“Quando temos aumento de petróleo, dólar e fertilizantes, esses produtos têm uma tendência de aumento expressivo em seu custo produtivo. Outra questão é a instabilidade econômica que a guerra causa no mundo como um todo”.

Conforme noticiado recentemente pelo Correio do Estado, o produtor deve ter incremento de quase 60% no custo da produção para a safrinha do milho, e com a alta ainda não precificada em decorrência da guerra esse valor pode encarecer ainda mais.

O engenheiro agrônomo Everton Tiago Bortoloto afirma que, com a escalada desses preços, o aumento no custo de produção pode aumentar ainda mais. “Muitos produtores já compraram fertilizantes este ano, mas se mantiver essa toada deve ficar mais caro na próxima safra”.

“Quem perde mais é o produtor que não tem caixa. Estou falando de produtores de 500 hectares para cima. O retorno pode ser ainda mais baixo com esse conflito. Quem travou o grão no começo do plantio perdeu dinheiro, mas quem tá colhendo e vendendo ainda consegue ter margem por causa do preço da saca nunca antes visto”, relata.

Outro produto derivado da soja, o farelo, negociado a R$ 2.900 a tonelada nesta sexta, segue a mesma tendência de alta, com auxílio da valorização da matéria-prima como propulsor.

“O preço do grão reflete no custo dos subprodutos, e isso tem aumentado nos últimos dias”, afirma Dávalo.

FERTILIZANTES

Outra preocupação nacional, e não obstante dos produtores sul-mato-grossenses, é a possível crise de fertilizantes. O Brasil é o quarto maior importador mundial de fertilizantes e 25% do volume vêm da Rússia.

O potássio é o mineral mais dependente na produção brasileira, 95% são importados e 28% vêm diretamente da Rússia. O drama maior são com os nitratos de amônia que são praticamente todos importados daquele país.

Pavão vê o tema dos fertilizantes como preocupante, porém como um assunto secundário.

“É algo que passamos a noticiar recentemente, mas temos como substituir a oferta por produtos do Canadá e de Marrocos. O negativo é que não conseguiremos substituir na mesma quantidade”, analisa.

A Ministra da Agricultura, Tereza Cristina, garantiu os estoques até o mês de outubro. Ela ainda anunciou ida ao Canadá para fechar acordos que reforcem o fornecimento de fertilizantes.

Já a Associação Nacional para Difusão de Adubos (Anda) aponta que atualmente o Brasil tem estoque de fertilizantes para os próximos três meses.

Com alta de 20%, petróleo vai a US$ 118

Como informado pelo Correio do Estado na edição do dia 3 de março, a expectativa é de que, caso o conflito se estenda por um bom tempo, os preços dos combustíveis disparem.

O barril do petróleo tipo Brent pode ultrapassar a marca de US$ 147 a unidade, conforme estimativa do mercado internacional. Tal valor foi observado em 2008, ano da crise econômica do subprime.

O petróleo acumulou ganho semanal de mais de 20% nos contratos mais líquidos em Nova York e Londres. O barril do petróleo WTI subiu 7,44% nesta sexta e chegou a US$ 115,68. Já o Brent avançou 6,93% na sessão do dia 4 de março a US$ 118,11.

A Petrobras anunciou que segue de perto a variação, mas não deu nenhum indicativo de alta. Na quarta-feira, a defasagem entre os preços do mercado internacional e os praticados pela estatal chegaram a 27% no diesel e 24% para a gasolina.

O presidente Jair Bolsonaro (PL) afirmou na quinta-feira que a Petrobras sabe da sua responsabilidade e o que pode fazer para que os preços dos combustíveis no Brasil não disparem apesar da alta internacional do petróleo.

Ele sugeriu que a estatal diminua sua margem de lucro.