Ao mesmo tempo em que o Brasil registrou recorde na potência instalada de energia solar, chegando a 24 gigawatts (GW), a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) aprovou a regulamentação para geração de energia própria renovável com mudanças.
A ideia era que a regulamentação da Lei nº 14.300 fosse feita ainda em 2022, já que a legislação foi sancionada em janeiro do ano passado.
Um ano depois da sanção do Marco Legal da Geração Própria, que trouxe a incidência de taxas a partir de 2023, a entidade discutiu as regras em audiência pública e aprovou uma versão “modificada” da lei.
Agentes ligados ao setor consideram que houve avanços na regulamentação da Lei nº 14.300/2022, embora admitam que alguns pontos precisarão de ajustes.
O presidente da associação Movimento Solar Livre (MSL), Hewerton Martins, já antecipou que está agindo no Senado para que o Projeto de Lei nº 2.703, que tentou postergar o início da taxação, volte à cena corrigindo a redação da Lei nº 14.300 e coíba os abusos da Aneel com o pequeno consumidor de microgeração.
Para Martins, o momento é de ler, digerir e entender, atualizar planilha, rever o custo de disponibilidade, analisar impactos e ir ao Congresso Nacional. Ele deixa claro que não está descartado o risco de cobrança tripla para o pequeno consumidor.
“Cobrar rede de distribuição [o chamado fio B], cobrança de demanda e potência de rede [TUSDg], que é só para grandes indústrias, e o custo de disponibilidade é uma cobrança tripla para o pequeno consumidor”, avaliou Martins.
Para o presidente do MSL, que atua em Mato Grosso do Sul, fazer essa cobrança é como se a pessoa estivesse em um ônibus e pagasse a passagem, além de pagar o motorista e ainda bancar o combustível.
“Semana que vem será de peregrinação para verificar todas as emendas à lei, até porque a Aneel está querendo legislar sobre o Congresso Nacional. É preciso adequar o texto e melhorar a situação para o pequeno consumidor”.
“Estão construindo uma narrativa inversa para prejudicar o cidadão que coloca as placas fotovoltaicas em sua casa, estão agindo a favor dos grandes. A verdade é que enquanto não for publicada a regulação homologatória haverá, sim, o risco de tripla cobrança”, enfatizou Martins.
REGULAMENTAÇÃO
Análise feita pela Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (Absolar) destaca que essa aprovação – mesmo com atraso de sete meses no prazo legal – traz um balanço de regulamentação positivo, com o afastamento do risco de inviabilizar a energia solar para pequenos consumidores.
A entidade esboçou que o colegiado da Aneel acabou agindo da forma mais adequada no ponto mais crítico, que seria a cobrança de taxas em duplicidade sobre os pequenos consumidores que geram a própria energia.
O texto aprovado esclareceu que os dois pontos restantes – no caso, a cobrança de demanda na baixa tensão e optante B – dependem apenas de ajuste na redação da lei e o Congresso Nacional dará o veredito.
O presidente da Absolar, Rodrigo Sauaia, deixou claro que há dois pontos críticos pendentes e que a entidade vai trabalhar com o Congresso Nacional para solucionar essas questões e ajustar o texto da lei, trazendo mais segurança jurídica, transparência, previsibilidade, estabilidade e equilíbrio para aplicação da legislação.
“A Absolar trabalha para que os benefícios da modalidade sejam corretamente valorados e incluídos nas diretrizes a serem oficializadas pelo Conselho de Políticas Energéticas (CNPE) por meio de resolução. Essas diretrizes ditarão o futuro da geração própria de energia renovável no Brasil, que é um elemento essencial na transição energética do País”, apontou Sauaia.
Para a vice-presidente de geração distribuída da Absolar, Bárbara Rubim, houve avanços importantes em relação ao que havia sido proposto pelas áreas técnicas da Aneel, sobretudo a eliminação da cobrança em duplicidade do custo de disponibilidade e da chamada TUSD Fio B (Tarifa de Uso do Sistema de Distribuição), encargo pelo uso da rede.
“Sem dúvida, isso afastou o risco de inviabilizar a geração própria de energia solar para a sociedade brasileira”, explica Bárbara.
Um alerta foi aceso no sentido de garantir a importância de atuação da Aneel na fiscalização das distribuidoras em relação ao cumprimento dos prazos e nas obrigações previstas na lei, além da regulamentação em questões concorrenciais, para que se possa garantir equilíbrio de mercado para os pequenos empreendedores solares poderem competir em iguais condições com os grandes grupos econômicos do setor.
Sobre a duplicidade na cobrança, a área técnica da Aneel esclareceu ao Canal Solar como fica isso na prática.
“Se a soma do consumo da rede com parcela do Fio B na compensação for menor do que a disponibilidade [em R$], paga-se o custo de disponibilidade somente. Se a soma acima for maior, paga-se o Fio B e o consumo da rede, e a disponibilidade não será paga”.
LIMITES
A presidente do Conselho de Consumidores da Área de Concessão da Energisa em Mato Grosso do Sul (Concen-MS), Rosimeire Costa, defende limites da micro e minigeração distribuída (MMGD), que são pequenas centrais de geração de energia elétrica locais por meio de fontes renováveis ou cogeração qualificada, para não sobrecarregar consumidores.
Na reunião da Aneel, foram solicitados limites temporais para a expansão da MMGD, de forma a não sobrecarregar os consumidores cativos, principalmente porque a sobrecontratação e os subsídios impactam na tarifa.
Rosimeire Costa destacou o vultoso contingente de pedidos protocolados para fazer uso de energia limpa – com um resultado bem acima do previsto no planejamento do setor.
“O que vai acontecer com o nosso projeto daqui a cinco anos na área de concessão na Energisa em Mato Grosso do Sul? Eu vou ter um estressamento da rede, trocar cabo, transformador”.
Observou, ainda, que a pressão nesses números refere-se a grandes geradores centralizados, e não às pessoas que investiram com o intuito de aliviar o orçamento.
FONTE: CORREIO DO ESTADO