Uma das mudanças previstas no texto da reforma tributária é a implantação de um sistema de cashback na conta de energia elétrica de famílias de baixa renda. Em Mato Grosso do Sul, nos 74 municípios atendidos pela Energisa MS, 213.003 unidades consumidoras são beneficiadas pela tarifa social de energia elétrica e devem sofrer com o aumento previsto na nova legislação.

De acordo com o último relatório apresentado na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), no dia 25 de outubro, pelo senador Eduardo Braga (MDB-AM), está prevista a devolução de impostos, chamada de cashback, para famílias carentes na fatura de energia elétrica. O relatório também estabeleceu um limite da carga tributária para evitar o aumento futuro dos porcentuais da Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), que será a unificação dos tributos federais, e do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), que vai reunir os tributos estaduais e municipais.

A mudança na tarifa social da tarifa traz questionamentos do setor energético, dos consumidores e também do poder público, que refutam o impacto para as famílias de baixa renda. Para o consumidor, o ônus é o aumento real com o fim da conta zerada, e, para as concessionárias, pode haver o crescimento da inadimplência.

A presidente do Conselho de Consumidores da Área de Concessão da Energisa em MS (Concen-MS), Rosimeire Costa, participou de evento nacional sobre o impacto da reforma para o segmento energético, com os senadores Eduardo Gomes (PL), Efraim Filho (União Brasil) e Zequinha Marinho (Podemos) e o diretor institucional da Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica (Abradee), Wagner Ferreira.

Em entrevista ao Correio do Estado, Rosimeire detalha que a proposta prevê um sistema em que o consumidor paga primeiro para depois realizar o recebimento. “Ele teria de desembolsar para posteriormente receber, fato que ainda não ficou muito claro, mas que, em nossa visão, deve ser assegurado durante a transição”, afirma.

A representante dos consumidores destaca que a prioridade será assegurar esse período de transição, ressaltando que para o Concen-MS não está claro como seria o sistema na prática.

“Temos no Brasil 17 milhões de famílias na tarifa social, então, avalia-se qual o impacto de se desembolsar para depois receber, uma vez que em nossa área de concessão está em torno de R$ 26 [o valor do cashback, considerando 100 quilowatts-hora]”, explica Rosimeire.

Ela ainda revela que o Concen-MS vai enviar uma carta externando esta preocupação, que será entregue aos representantes de MS no Senado, Tereza Cristina (PP), Nelsinho Trad (MDB) e Soraya Thronicke (Podemos), a fim de que eles a divulguem para os estudiosos da questão.

“Não está sendo observado o desdobramento, em que o impactado será o [consumidor de] baixa renda, porque, para quem está no comércio, o cashback é importante, mas, para o consumidor, essa diferença de R$ 28 a R$ 33 ele não tem. Ele tem R$ 100, mas não tem R$ 130, que é a fatura, então, ele vai ficar inadimplente”, enfatiza Rosimeire.

EFEITOS

Autoridades e estudiosos apontam que o setor energético será drasticamente afetado pela reforma tributária, e o efeito será direto para o consumidor, principalmente a parcela dos menos favorecidos.

Os detalhes sobre o cashback serão definidos por meio de lei complementar. O relator da pauta no Senado, Eduardo Braga, sugere que a devolução ocorra no momento da cobrança.

“A devolução, de que trata o § 5º, VIII, e o § 18 do art. 195, será obrigatória nas operações de fornecimento de energia elétrica ao consumidor de baixa renda, podendo a lei complementar determinar que seja calculada e concedida no momento da cobrança da operação”, diz trecho do parecer.

Atualmente, além da tarifa social – somente em Campo Grande são 9.462 famílias beneficiadas –, o Estado tem o Programa Energia Social – Conta de Luz Zero, que garante a isenção de 100% a famílias que consomem até 220 kWh por mês. São 152 mil famílias carentes beneficiadas.

No Brasil, a isenção da conta e os descontos da tarifa social variam de acordo com o consumo de energia da residência: as que consomem de 1 kWh a 30 kWh têm direito a 65% de desconto; de 31 kWh a 100 kWh, 40%; e as que consomem de 101 kWh a 220 kWh, 10%.

“Levamos cinco anos organizando o benefício na ponta, junto ao consumidor. Esse benefício é auditado pelo TCU [Tribunal de Contas da União], fiscalizado pela Aneel [Agência de Energia Elétrica], então, mexer nesse sistema nesse momento não é favorável”, pontua Rosimeire Costa.

O senador Zequinha Marinho reforça que lutará pela manutenção da tarifa solidária. “Observamos o caráter social e vamos insistir ao relator para que tenhamos um sistema mais justo”.

Outro ponto discutido com o avanço da reforma tributária é o texto da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) nº 45, que, ao passar pela Câmara dos Deputados, abriu uma brecha para o aumento de impostos sobre a energia elétrica. O texto não reconhece a energia como um bem essencial. A nova redação possibilitaria ainda a incidência de um imposto seletivo.

Conforme estimativa da Abradee, as famílias de baixa renda podem ter um aumento de até 30% em suas contas de energia elétrica, já que o texto atual da reforma não menciona regime especial ou redução de tributos.

Hoje, a tarifa social garante um desconto escalonado para consumidores menos favorecidos economicamente, de acordo com o consumo de cada família. Ainda segundo a Abradee, cerca de 40% dos consumidores residenciais do País estão em um grupo com isenção tributária.

“No texto atual da PEC, essas pessoas poderão pagar alíquota cheia na fatura de energia, que deve variar de 27% a 30%”, destaca o diretor institucional da Abradee, Wagner Ferreira.

 

FONTE: CORREIO DO ESTADO