O projeto de lei (PL) que formaliza o programa Desenrola Brasil, do governo federal, e também prevê limite para o rotativo do cartão de crédito pode trazer efeitos positivos para Mato Grosso do Sul. O projeto foi aprovado na Câmara dos Deputados na terça-feira e segue para o Senado.
Ao mesmo tempo, uma nova fase do programa Desenrola será realizada até o fim deste mês. A etapa traz a opção de renegociação para quem tem renda de até dois salários mínimos e deve até R$ 5 mil.
Para o doutor em Economia Michel Constantino, no âmbito regional, tanto a nova fase do programa quanto as mudanças aprovadas na Câmara darão fôlego à economia. “Realizar a negociação ajuda, mesmo em pequena escala, a atividade econômica. Mas é necessário ressaltar que essa iniciativa tem efeito temporário, pois deverá vir com um plano de recuperação e educação financeira”.
O economista Eduardo Matos aposta que as mudanças no rotativo poderão ser positivas para ambos os lados do consumo, tanto para empresários como para clientes.
“Agora, os hábitos de consumo, tanto do sul-mato-grossense como do brasileiro, não devem sofrer grandes mudanças. O acesso ao cartão de crédito é bem democratizado atualmente, então, o fato de baratear o crédito poderá incentivar o consumo”.
Matos ressalta ainda que a questão da saúde financeira será outro aspecto positivo, uma vez que a utilização excessiva do rotativo é considerada prejudicial. “Essa mudança fará com que boa parte dos brasileiros pague menos juros, o que poderá dar uma margem maior para efetuar gastos extras, dado que a renda estará menos comprometida”, afirma.
Em complemento, o economista Márcio Coutinho ressalta que a taxa de juros do rotativo do cartão de crédito é uma das maiores do mercado, mas poderá ser atenuada com as novas determinações aprovadas na Câmara. “A grande questão é acabar com a alta taxa de juros, que acaba influenciando no consumo, levando em conta que a intenção, ainda assim, é manter a economia aquecida”.
ROTATIVO
O Projeto de Lei nº 2.685/2022 foi aprovado na forma de um substitutivo do relator, deputado Alencar Santana (PT-SP). O relator incorporou ao texto a Medida Provisória 1.176/2023, que cria o programa Desenrola Brasil, a fim de incentivar a renegociação de dívidas, ofertando garantia para aquelas de pequeno valor (até R$ 5 mil).
O texto prevê um limite para os juros do rotativo do cartão de crédito, contudo, a decisão só será validada se não houver manifestação por parte das instituições financeiras no prazo de 90 dias.
De acordo com o texto aprovado, os emissores de cartão de crédito e de outros instrumentos de pagamento pós-pagos utilizados em arranjos abertos (cartão de bandeira) ou fechados (cartões de redes varejistas) deverão apresentar ao Conselho Monetário Nacional (CMN) proposta de autorregulação das taxas de juros e encargos financeiros cobrados no crédito rotativo e no parcelamento de saldo devedor das faturas de cartões de crédito. Os limites deverão ser anuais e apresentados com fundamento.
Caso esses limites não sejam aprovados pelo conselho no prazo de 90 dias, contados da publicação da futura lei, o total cobrado de juros e encargos não poderá ser superior, em cada caso, ao valor original da dívida.
“Para que não seja acusado o parlamento de intervir na economia, nós estamos dando um prazo de 90 dias ao setor que emite cartão de crédito, aos bancos e às demais instituições financeiras para que apresentem uma proposta ao Conselho Monetário Nacional”, disse Santana.
Segundo os últimos dados divulgados pelo Banco Central, a taxa média de juros praticada pelos bancos no caso de pessoas físicas no rotativo do cartão de crédito chegou a 440% ao ano. O rotativo do cartão de crédito, possibilidade oferecida ao consumidor quando o pagamento total da fatura do cartão não é realizado até o vencimento, também entra em cheque.
Quando não ocorre o pagamento integral do débito, o cliente entra no rotativo, com a diferença entre o valor total e o que foi pago se transformando em uma espécie de empréstimo.
O projeto indica que a taxa cairá para 100% ao ano. Assim, os juros do rotativo, de quase 15% ao mês, cairiam para 5,5% ao mês, e quem tem uma dívida de R$ 1 mil terá de pagar R$ 2 mil, e não cinco vezes mais
NOVIDADE
Com alterações em seu texto-base, os microempreendedores individuais (MEIs) e as pequenas empresas serão beneficiados pelo espaço de renegociação no programa destinado à parcela da população com o crédito negativado.
Em Mato Grosso do Sul, eram 172.527 registros de MEIs até o mês de agosto, conforme aponta o Sebrae-MS, com base em dados da Receita Federal, os quais poderão ser beneficiados com o incremento do projeto.
O mestre em Economia Lucas Mikael salienta que é importante dar oportunidade aos pequenos negócios para que consigam participar do programa como credores, como os grandes bancos. “Essa medida teve como objetivo liberar o consumo. Quando há a desnegativação, o consumidor pode voltar a fazer crediário, mas isso não implica a quitação da dívida”.
Outra novidade em relação ao projeto original é a portabilidade da dívida do cartão de crédito e de outros débitos relacionados a ele, mesmo os já parcelados pelo próprio cartão ou de contas vinculadas ao cartão para seu pagamento (instrumento de pagamento pós-pago). Assim, o consumidor poderá buscar ofertas de juros menores para equacionar sua dívida com outra instituição financeira.
A regulamentação caberá também ao CMN, em um prazo de até 90 dias após a publicação da futura lei. A ideia é estimular a competição entre as emissoras de cartão.
NOVA FASE
Já a nova fase do Desenrola Brasil, sendo esta a faixa 1, está programada, conforme calendário do governo federal, para ser iniciada no fim deste mês. Nessa etapa, dívidas com varejistas e concessionárias, por exemplo, as de serviços básicos como água e energia elétrica, poderão ser renegociadas também por meio de um leilão.
Dessa forma, a faixa 1 do programa de renegociação abrange débitos com origens bancárias e não bancárias da parcela da população com renda de até R$ 2.640, ou seja o equivalente a dois salários mínimos, e também os inscritos no Cadastro Único (CadÚnico) para programas sociais do governo federal.
A condição viabilizará a reestruturação de dívidas com valores de até R$ 5 mil, contraídas entre 1º de janeiro de 2019 e 31 de dezembro de 2022.
Vale ainda destacar que, no âmbito nacional, a maior parte das dívidas em atraso no País não está relacionada a instituições financeiras, como bancos, mas, sim, a empresas do comércio varejista e também a serviços essenciais.
O Desenrola não se aplica a dívidas com garantias reais, dívidas de crédito rural, financiamentos imobiliários ou operações envolvendo financiamento.
FONTE: CORREIO DO ESTADO