O crescimento de 16,3% nas vendas de veículos leves e pesados no primeiro trimestre não impressionou a Fenabrave (associação dos revendedores). A entidade está na linha de frente das negociações pela volta dos carros populares.
Ao apresentar os números de mercado nesta terça (4), José Mauricio Andreta Jr., presidente da entidade, ressaltou que a alta acumulada se deve mais aos resultados ruins registrados entre janeiro e março de 2022.
Aqueles meses foram impactados pela falta de componentes e por um aumento nos casos de Covid-19 devido à variante ômicron.
Foram emplacadas 471,6 mil unidades no primeiro trimestre -com destaque para o mês de março, que terminou com 198,9 mil licenciamentos.
“A alta global foi potencializada pela diferença de dias úteis do último mês [23 dias] ante fevereiro [18 dias]”, disse Andreta Jr.
Com o resultado, a Fenabrave manteve as previsões sobre vendas de veículos de passeio. A associação acredita que, neste ano, não haverá crescimento na comercialização em relação a 2022. Há, contudo, esperança de que o cenário mude a médio prazo com a volta dos carros populares.
“Estamos acompanhando o movimento e disponibilizamos dados para o governo. Para nós, o crescimento tem que vir de baixo para cima”, afirmou Andreta Jr. “Precisamos de escala de produção.”
Na visão da Fenabrave, o retorno de carros com preços entre R$ 50 mil e R$ 60 mil ao mercado vai movimentar as lojas e as oficinas. A associação, contudo, não apoia um dos pontos em pauta: o retorno de carros movidos somente a etanol.
“Não há pressão [nas negociações] para que os carros sejam 100% a álcool, mas queremos que o uso dessa opção seja incentivado”, disse o presidente da entidade.
A ideia de lançar modelos populares movidos somente a etanol está relacionada a metas de descarbonização. Nesse caso, a tendência é que os veículos sejam mais eficientes: ao ajustar o motor para um único combustível, é possível obter resultados melhores em consumo e emissões.
Andreta Jr. disse que a evolução dos métodos de produção, com soluções que vão além do ciclo tradicional da cana-de-açúcar, afasta possíveis problemas de abastecimento e variação de preços.
“Já existe o milho híbrido que só serve para fazer etanol, e dá para tirar mais álcool do bagaço da cana. Sem desmatar, é possível aumentar a produtividade em 30%”, disse o executivo, citando estudos da Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária).
“Ao se considerar toda a cadeia, o que polui menos é o etanol puro. O carro elétrico tem mercado, mas vai continuar existindo em gamas mais altas”, disse o presidente da Fenabrave.
A associação dos revendedores, entretanto, ainda não tem uma resposta sobre como seria possível incentivar o uso do etanol em carros flex. Devido ao preço nas bombas e ao rendimento no tanque, sai mais em conta usar gasolina na maior parte dos estados.
As propostas em discussão incluem desde redução de tarifas até a concessão de créditos ou redução de impostos a quem deixar o combustível fóssil de lado. Segundo Andreta Jr., essas conversas ainda estão no início.
João Irineu, vice-presidente de assuntos regulatórios do grupo Stellantis, vê a combinação de etanol com tecnologias de eletrificação como solução para o mercado brasileiro, que possui fontes de energia mais limpas do que as disponíveis na Europa.
“O etanol deve ser combinado com diferentes níveis de eletrificação em um processo que permita distintas configurações de propulsão híbrida, que podem ser distribuídas ao longo do nosso portfólio de forma economicamente viável, ambientalmente correta e socialmente equilibrada”, disse o executivo. “Queremos promover uma descarbonização acessível em todos os níveis.”
Caso surja uma nova linha de tributação que estimule o retorno de carros 100% a etanol -sejam populares ou mais caros-, o grupo Stellantis já tem uma solução pronta. Em 2019, a Fiat revelou o desenvolvimento de um motor turbo de alta eficiência energética que só consome álcool hidratado.
Seja mono ou bicombustível, o sucesso dos carros populares desejados por montadoras e revendedores está ligado também a um programa de renovação de frota. Andreta Jr., porém, afirmou que o plano mencionado nesta segunda (3) pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, ainda não entrou nas discussões.
“A ideia de renovar a frota depende de retirar o carro mais antigo das ruas, e isso tem que passar por um processo de o governo comprar”, disse o presidente da Fenabrave, mencionando o uso de opções como os créditos de carbono para fazer esse movimento.
FONTE: CORREIO DO ESTADO