A produtividade do trigo em Mato Grosso do Sul aumentou 92,84%, na comparação entre a safra 2021 e a safra 2022. No último ano, produtores do Estado que optaram pela cultura no inverno colheram, em média, 1.230 kg por hectare, contra 2.372 kg nesta safra.
Apesar de quase dobrar a produtividade, em termos de produção, a alta foi bem menor, com o total da safra tendo chegado a 48,6 mil toneladas, contra 43,1 mil toneladas da última temporada, avanço de 12,8%. Isso aconteceu porque a área plantada da cultura caiu 41,4% no período.
Nacionalmente, a produção também subiu consideravelmente, atingindo 9,5 milhões de toneladas, aponta o boletim da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), alta de 23,7% em relação às 7,679 milhões de toneladas em 2021, com produtividade média de 3,114 mil kg por hectare.
O desinvestimento em MS pode ter sido motivado pelas intempéries climáticas que assolaram a região sul do Estado e causaram quebra na produção do milho, cultura concorrente durante o inverno.
INSTABILIDADE
O cereal voltou a ganhar atenção no País no começo do ano, com a invasão da Rússia à Ucrânia. O conflito entre a terceira maior produtora mundial e a sétima, respectivamente, tirou por alguns meses cerca de 30% da oferta global do grão do mercado. Com a exportação ucraniana estabilizada, em outubro, o balanço era de queda de 34,54% no volume de grãos exportado, na comparação com 2021.
De acordo com a Agência Reuters, a Ucrânia tinha exportado até o último mês 10,8 milhões de toneladas, ante 16,5 milhões em 2021. A quantidade de trigo até o momento era de quase 4 milhões de toneladas exportadas no período de safra 22/23.
Antes que a oferta fosse estabilizada, o trigo passou por alta de 51% no mercado internacional, saindo de US$ 811 a tonelada para US$ 1.230 poucos dias após o início da guerra.
De acordo com o site Trading Economics, o preço voltou a se estabilizar em patamares similares aos anteriores ao conflito e foi negociado na semana passada a US$ 808 a tonelada.
Outro movimento que volta a influenciar no preço do trigo é o comunicado da Bolsa de Comércio de Rosário, na Argentina, de que a safra 2022/ 2023 vai ser de forte quebra no país vizinho.
Isso preocupa principalmente o Brasil, pois é de lá que vem boa parte das 6 milhões de toneladas que compõem o consumo interno nacional, estimado em torno de 15 milhões de toneladas por ano, segundo especialistas.
A outra parte dos 15 milhões é importada de países como Estados Unidos, Uruguai, Paraguai e Argentina, causando impacto de US$ 10 bilhões na balança comercial.
A expectativa atual é de que a produção da Argentina fique em 11,8 milhões de toneladas, abaixo dos 13,7 milhões de toneladas projetados no mês anterior, em razão da falta de água e das geadas tardias na região dos pampas, informou a entidade em relatório. A entidade contabiliza 5,9 milhões de hectares plantados com trigo e uma perda de área de 830 mil hectares.
OPORTUNIDADE
Segundo o consultor e doutor em Agronomia José Ubirajara Fontoura, a viabilidade do trigo para Mato Grosso do Sul está mais que comprovada. O profissional foi pioneiro na implantação do trigo no Estado, na década de 1970.
“Já plantamos 570 mil hectares em uma safra, graças à tecnologia da Embrapa’’, revela. Dados da Conab apontam que, na safra 2022, MS plantou 25 mil hectares, contra 35 mil hectares em 2021, uma queda de 41,4%.
Segundo a Embrapa, a justificativa para a expansão da área plantada é que o clima do norte do Paraná e do sul de MS são muito similares. Portanto, se o Paraná tem condições de ser um dos maiores produtores do Brasil, Mato Grosso do Sul também tem.
“Se pegarmos esse quadrilátero que engloba Sidrolândia para baixo até a divisa do Paraná e a região de Nova Alvorada para o oeste, em direção à fronteira, temos potencial de quase 1 milhão de hectares com capacidade de receber o trigo”, revela.
Para Fontoura, a viabilidade da produção do cereal está em vias de crescer e o foco agora é fazer a cultura ser mais produtiva.
“Temos que reforçar esse potencial de produtividade, porque está mais elevado. A tecnologia existe por esse trabalho da Embrapa e de empresas associadas, que, em parceria, pegam a tecnologia e investem em desenvolvimento e validação, conhecimento e informação para o produtor”, finaliza.
De acordo com o gerente-executivo da Fundação Meridional, Ralf Dengler, muitas vezes, o produtor não investe no manejo, pois não tem certeza do resultado econômico.
“Principalmente pela falta de liquidez do seu produto no mercado. Esta situação vem mudando nos últimos dois a três anos, mas ainda precisamos evoluir muito para atingir o máximo potencial do trigo em MS”, comenta.
ALTERNATIVA
Diretor-presidente da Embrapa Trigo, Jorge Lemainski assegura que é possível chegar à autossuficiência de trigo em menos tempo que o esperado: até 2030, o Brasil produzirá 20 milhões de toneladas e passará a exportar o cereal.
“Será feito diagnóstico de áreas potenciais, capacitação e amostragem para condução do processo. Dessa forma, o produtor terá conhecimento do momento de semear, cuidados com adubação de cobertura e proteção contra invasão de pragas, além de conhecer os custos. Ao fim, nos reuniremos com os atores para convergir a agenda do trigo”, explica.
Conforme Lemainski, o trigo tem a possibilidade de ser alternativa de dinamizar a economia local dentro do sistema de produção.
“Temos que demonstrar com as boas práticas agronômicas e ressaltar que o trigo tem espaço na indústria moageira. Ele pode compor também a ração animal, sendo bem competitivo com o milho. No Sul do País, ele já é utilizado, porque o milho de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul chega com um alto custo de transporte”, revela.
Outro ponto positivo, segundo o pesquisador, é que o trigo tem sinergia melhor que o milho para a lavoura de soja. “Uma palhada forrageira de trigo pode aumentar em até 30% a produtividade da soja”.
Lemainksi prossegue dizendo que, para controle de pragas e estratégias defensivas, o trigo aceita basicamente os mesmos produtos usados na soja, fornecendo uma vantagem para o produtor que rotaciona com o milho.
“O produtor que sofre com a incidência de cigarrinha e tem dificuldades em controlá-la, para ele acaba sendo mais interessante fazer a troca”, finaliza.
Trigo já figurou como a 2ª maior safra estadual.
FONTE: CORREIO DO ESTADO