Não existe povo mais apaixonado por futebol que o brasileiro – isso todos sabemos. O brasileiro é um povo também bastante amigável: não existem dados concretos sobre qual seria o povo mais amigável do mundo, mas com certeza temos uma boa chance de subir ao pódio com nossa cordialidade e hospitalidade tropicais. Por causa disso, é um acerto fazer um filme que une futebol e amizade, dois dos mais presentes temas na vida dos brasileiros. E são muitos os acertos do filme 45 do Segundo Tempo.
Pedro (Tony Ramos) é dono de uma cantina italiana e está cheio de dívidas. Palmeirense fanático, sua situação só piora quando a cantina é interditada pela vigilância sanitária. Ivan (Cássio Gabus Mendes) é um advogado super ocupado que está vivendo uma crise em seu casamento com Lilian (Denise Fraga).
Mariano (Ary França) é um padre aparentemente convencional – e torcedor do Corinthians. Pedro, Ivan e Mariano são velhos amigos que não se viam há quase quarenta anos. O reencontro acontece quando são chamados por jornalistas para recriar uma foto tirada no dia da inauguração do metrô de São Paulo. Novamente em contato com os dois velhos amigos, Pedro pede a ajuda deles para se matar – se o Palmeiras for campeão.
A Ivan caberão os trâmites legais antes e depois do suicídio. Mariano fica encarregado de presidir um funeral para Calabresa, fiel companheira canina de Pedro, que morrera no dia anterior à comunicação da grande decisão, e mais tarde Mariano também terá de presidir o funeral de Pedro. Até que o dia fatídico da última rodada do campeonato chegue, os amigos decidem visitar Soninha (Louise Cardoso), antiga crush deles. Se o Palmeiras ganhar o Campeonato Brasileiro, Pedro morrerá feliz.
Além da história de Pedro, temos momentos de embate entre a praticidade materialista de Ivan e o idealismo espiritual de Mariano – até que o padre passa por sua própria crise, uma crise de fé e de vocação. A crise de Ivan não é apenas matrimonial, pois outras crises se delineiam: ele descobre que seu filho único, João (Filipe Bragança) é gay, e reavalia sua prática como advogado. Embora seja verossímil a confusão sentida por Ivan ao ser confrontado com a sexualidade do filho, a resolução é menos que ideal – nada de discurso afirmador cheio de amor ao estilo do pai de Elio em Me Chame Pelo Seu Nome – e teria sido talvez mais proveitoso explorar como Ivan se via um idealista na juventude mas acabou se tornando um advogado defendendo pessoas que estão longe de serem inocentes.
45 do Segundo Tempo é também um filme sobre finitudes, não apenas exploradas na morte da cadela Calabresa ou no plano de suicídio de Pedro. A finitude começa a ser explorada no momento da foto, quando o trio descobre que o quarto garoto que estava presente na foto original faleceu de repente. A perda do amigo que voltaria a fazer uma foto com eles é mais tarde confrontada e ressignificada, e por isso também podemos afirmar que este é um filme sobre perdas: perda das expectativas, dos laços, e até de nós mesmos, algo que pode acontecer dependendo de nossas escolhas e das condições impostas pela vida.
Foi a história de recriação de uma foto, quarenta anos depois de ter sido tirada, que inspirou o diretor e roteirista Luiz Villaça a preparar um roteiro sobre o efeito do tempo nas amizades, além de todos os sonhos e expectativas que ficam pelo caminho com o passar dos anos. O diretor também tirou muita inspiração da própria história, sendo ele descendente de italianos e palmeirense. Não chega a ser um filme autobiográfico, mas os espelhamentos com a vida real adicionam uma camada de verdade à película.
Vendido como um filme “que nos emociona, que nos faz rir e chorar ao mesmo tempo”, 45 do Segundo Tempo não chega a ser toda essa montanha-russa de emoções. É uma película bem feita, cheia de carinho e camaradagem. Felizmente, não é preciso ser palmeirense, entender de futebol ou ser exímio conhecedor da culinária e da imigração italiana para apreciar 45 do Segundo Tempo. Basta ter tido amigos, se reencontrado com um velho conhecido alguma vez, ou ter se questionado sobre o sentido da vida. Enfim, um filme que tende a agradar a todos.