“São muitas portas fechadas”. É assim que o cacique da Aldeia Terra Indígena Guató, Laucídio Corrêa da Costa – da menor etnia de Mato Grosso do Sul em número, mas uma das mais raras e importantes, por ser conhecida como o povo primitivo do Pantanal e por ser a guardiã de uma área de 10,9 mil hectares na Serra do Amolar –, define a atuação da Fundação Nacional do Índio (Funai) em Mato Grosso do Sul.

“É por isso que o cacique tem que viajar, se atualizar, entender de mídia, dos nossos direitos. Saber o que está acontecendo nos governos, para poder pleitear recursos que são de direito, para que, assim, a Funai possa apoiar o desenvolvimento da aldeia”, afirma.

“A gente recorre à Funai para tudo. Precisamos deles para regularizar qualquer documento, para entrada de pessoas, de trabalho. Tudo isso e muito mais é com eles”, conta.

Do alto da Serra do Amolar, Laucídio conta que depende muito pouco do poder público. Quando a ajuda chega, ocorre por meio de outros órgãos que têm mais infraestrutura, como o Exército Brasileiro.

“É complicado, a gente vai lá [na Funai], tenta buscar, mas são muitas portas fechadas. Hoje a gente não tem mais uma representatividade boa lá dentro”, diz.

Um dos exemplos do descaso da Funai com a comunidade guató, conforme Laucídio, é o pedido de um trator que nunca chegou na aldeia e que poderia ter sido muito útil no período de 2019 a 2021, quando as queimadas na região foram intensas.

Por estar localizada na Ilha Insú, a Terra Indígena Guató foi uma das poucas áreas que escaparam das queimadas daquela época. Talvez não por acaso, a água é uma das divindades desta etnia. Mas o acesso à aldeia foi comprometido conforme a navegabilidade do Rio Paraguai ficou restrita.

“Naquela época ficamos sem acesso fluvial na aldeia. Até determinado ponto a gente conseguia chegar com as embarcações, levando alimento, combustível e outros mantimentos. Mas desse ponto em diante, precisávamos do apoio do Exército, que nos disponibilizava uma caminhonete para que chegássemos até a aldeia”, relata o cacique.

“Foi nesta época que pedimos um trator à Funai. Um apoio para chegarmos até a aldeia em um percurso de 30 quilômetros. Já faz três anos do pedido e até hoje a resposta não veio”, lamenta.

Saúde

A saúde é outro setor em que a comunidade tem dificuldade. Por viverem praticamente isolados, os atendimentos são mensais. “Uma vez por mês a visita chega na aldeia. Normalmente vem um odontólogo, um médico clínico geral, que traz vacinas e medicamentos básicos. Muito raramente vem um especialista, como um pediatra ou ginecologista”, conta.

Laucídio diz que todos os outros atendimentos são feitos em Corumbá, mas, em razão da distância, muitos indígenas têm dificuldade em buscar o auxílio, pois ficam sujeitos ao Sistema Único de Saúde (SUS), como os demais cidadãos.

Para piorar, não há uma casa de apoio, e muitos têm de ficar em casas de amigos, improvisar um abrigo ou ficar ao relento. “Acabam muitos pacientes não fazendo exames, porque é indígena e, aí, não tem onde ficar lá na cidade”, diz.

Apesar de a aldeia estar localizada no município de Corumbá, um índio guató tem de viajar uma noite inteira pelo Rio Paraguai para chegar à zona urbana. A distância física entre os dois pontos passa dos 300 quilômetros. “As autoridades do município alegam para nós que não há amparo financeiro, verba destinada e que não têm esse tipo de compromisso de cuidar da comunidade indígena”, acrescenta Laucídio.

A Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), órgão ligado ao Ministério da Saúde, desvincula o atendimento ao indígena do restante da população.

 

FONTE: CORREIO DO ESTADO